sexta-feira, 27 de agosto de 2010

STJ reconhece amplitude do conceito de consumidor em casos especiais

STJ

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) admitiu a ampliação do conceito de consumidor a uma pessoa que utilize determinado produto para fins de trabalho e não apenas para consumo direto. Com tal entendimento, a Terceira Turma negou provimento a recurso especial interposto pela M. M. Ltda., de Goiás, que pretendia mudar decisão de primeira instância. A decisão beneficiou uma compradora que alegou ter assinado, com a empresa, contrato que possuía cláusulas abusivas.

A consumidora, S. S. L., ajuizou ação judicial pedindo a nulidade de determinadas cláusulas existentes em contrato de compra e venda firmado com a M. para aquisição da determinada máquina, mediante pagamento em vinte prestações mensais. O acórdão de primeira instância aceitou a revisão do contrato da compradora, de acordo com a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor (CDC).

Mas, ao recorrer ao STJ, a M. alegou que não se configura como relação de consumo um caso em que o destinatário final adquire determinado bem para utilizar no exercício da profissão, conforme estabelece o CDC. Argumentou, ainda, que de acordo com o Código de Processo Civil (CPC), a ação deve ser julgada no foro eleito pelas partes - uma vez que, no contrato firmado, foi eleito o foro da comarca de São Paulo (SP) - para dirimir eventuais controvérsias da referida relação contratual, e não a comarca de Goiânia (GO) - onde correu a ação.

Amplitude

Ao proferir seu voto, a ministra relatora do recurso no âmbito do STJ, Nancy Andrighi, considerou que embora o Tribunal tenha restringido anteriormente o conceito de consumidor à pessoa que adquire determinado produto com o objetivo específico de consumo, outros julgamentos realizados depois, voltaram a aplicar a tendência maximalista. Dessa forma, agregaram novos argumentos a favor do conceito de consumo, de modo a tornar tal conceito “mais amplo e justo”, conforme destacou.

A ministra enfatizou, ainda, que “no processo em exame, o que se verifica é o conflito entre uma empresa fabricante de máquinas e fornecedora de softwares, suprimentos, peças e acessórios para a atividade confeccionista e uma pessoa física que adquire uma máquina de bordar em prol da sua sobrevivência e de sua família, ficando evidenciada sua vulnerabilidade econômica”.

Por conta disso, a relatora entendeu que, no caso em questão, pode sim ser admitida a aplicação das normas do CDC a determinados consumidores profissionais, “desde que seja demonstrada a vulnerabilidade técnica, jurídica ou econômica” da pessoa. Os ministros que compõem a Terceira Turma acompanharam o voto da relatora e, em votação unânime, negaram provimento ao recurso da empresa.

REsp 1010834

Maioria do STF admite pena alternativa para tráfico de drogas

JB ONLINE - PAÍS

Cinco dos nove ministros do Supremo Tribunal Federal presentes à sessão desta terça-feira consideraram inconstitucional o dispositivo da Lei de Drogas (Lei 11.343/2006) que proíbe a conversão da pena privativa de liberdade (reclusão) em pena alternativa (restritiva de direitos) quando se trata de condenado por tráfico de drogas. A inconstitucionalidade da norma não foi proclamada, no entanto, por que eram necessários, no mínimo, os votos de seis integrantes da Corte. O plenário decidiu aguardar a presença do ministro Celso de Mello – em licença médica – para concluir a votação do julgamento do habeas corpus que servirá de paradigma para dirimir a controvérsia.

O habeas corpus foi ajuizado pela Defensoria Pública da União em favor de um réu penalizado com um ano e oito meses de prisão, flagrado com 13,4 gramas de cocaína. Até agora, prevaleceu o voto do ministro-relator, Ayres Britto, para quem a lei comum não pode ignorar o princípio fundamental da Constituição da “individualização da pena”. Acompanharam o relator os ministros Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, e Cezar Peluso. Ficaram vencidos Joaquim Barbosa, Cármen Lúcia, Ellen Gracie e Marco Aurélio.

Na defesa do seu ponto de vista, Ayres Britto afirmou que “o princípio da individualização da pena significa o reconhecimento de que cada ser humano é um microcosmo”, conforme está expresso no inciso 45 do artigo 5º da Constituição: “Nenhuma pena passará da pessoa do condenado”. Segundo ele, uma lei pode estabelecer condições mais severas para a sua aplicação, mas “outra coisa é a lei proibir pura e secamente, como fez o artigo 44 da lei em causa”.

Os ministros vencidos citaram o inciso 46 do mesmo artigo 5º da Constituição, que dispõe: “A lei regulará a individualização da pena”, podendo adotar penas como a de privação ou restrição da liberdade e de prestação social alternativa. Cármen Lúcia e Ellen Gracie sustentaram que a Lei de Drogas não “padronizou” as penas, mas levou em conta “os interesses da sociedade” no sentido de que alguns crimes tenham penas mais severas. Marco Aurélio ressaltou que a própria Constituição dá tratamento diferenciado ao tráfico de drogas, ao considerá-lo crime inafiançável.

Luiz Orlando Carneiro, Jornal do Brasil

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Companhias telefônicas vencem ação da Cofins

VALOR ECONÔMICO - LEGISLAÇÃO & TRIBUTOS

As concessionárias de telefonia venceram ontem uma importante disputa tributária no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Por seis votos a três, a 1ª Seção considerou legal o repasse do PIS e da Cofins nas contas telefônicas. Os ministros analisaram um recurso da Brasil Telecom que contestava um acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS). A Corte estadual julgou ilegal a inclusão das contribuições na tarifa e o consequente repasse para os consumidores. De acordo com cálculos apresentados pela defesa da Brasil Telecom, caso a companhia tivesse que devolver os valores dos tributos arrecadados para os clientes, entre os anos de 2006 e 2009, teria que desembolsar R$ 2,1 bilhões.

O montante, segundo a empresa, seria desproporcional ao seu lucro no mesmo período, que totalizou R$ 1,3 bilhão. A Brasil Telecom alegou no STJ que o repasse já ocorre há 11 anos e foi autorizado pelo contrato de concessão firmado com a União. "Além do prejuízo, o fim do repasse dos tributos tornaria a atividade antieconômica", afirma o advogado Gustavo do Amaral Martins, do escritório Paulo Cezar Pinheiro Carneiro Advogados, que defende a companhia telefônica. A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) se manifestou na ação, em favor das concessionárias. O órgão regulador alertou para a possibilidade de aumento nas tarifas caso a interpretação do STJ fosse favorável aos consumidores, exigindo a devolução dos valores arrecadados com PIS e Cofins.

Já os consumidores argumentaram que o repasse não poderia ser mantido apenas para assegurar a margem de lucro das concessionárias. O advogado Cláudio Petrini Belmonte, que atua em causa própria no STJ contra a Brasil Telecom, defende que somente impostos cobrados sobre a operação de venda de bens e mercadorias e prestação de serviço - como o ICMS - poderiam ser repassados ao consumidor. De acordo com essa tese, o PIS e a Cofins não podem incidir diretamente na fatura, conta a conta, mas integrar proporcionalmente o custo da tarifa.

O ministro Luiz Fux, relator do processo, entendeu que o repasse é legítimo, pois essa possibilidade está prevista na Lei de Telecomunicações. O julgamento foi suspenso em junho, por um pedido de vista do ministro Benedito Gonçalves. Os consumidores estavam vencendo a disputa por quatro votos a dois. Mas ontem o placar se inverteu. O ministro Benedito Gonçalves acompanhou o voto do relator. Ele levou em consideração a preservação da tarifa que constou na proposta vencedora da licitação do serviço público, para que se tenha a justa remuneração e a prestação adequada do serviço.

Em sua última participação na 1ª Seção, a ministra Eliana Calmon, que vai assumir a Corregedoria Nacional de Justiça, entendeu que a sistemática do repasse é permitida pela lei, e votou a favor das concessionárias. No entanto, a ministra Eliana Calmon ponderou que há falta de clareza na cobrança, pois os contratos que disciplinam o repasse ficam ocultos dos contribuintes. De acordo com a ministra, seu voto foi dado com base no princípio da legalidade, apesar de, no caso, "as cifras serem impressionantes e a vedação do repasse condenar a empresa ao fracasso". O ministro Humberto Martins, que havia votado favoravelmente aos consumidores, decidiu mudar seu voto, o que resultou em um placar de seis votos a três para as concessionárias.

A decisão do STJ pode influenciar um caso semelhante, que será julgado também como recurso repetitivo pela Corte, envolvendo a legalidade do repasse de PIS e Cofins nas tarifas de energia elétrica. Caso sejam derrotadas, as distribuidoras de energia do país podem ter que devolver cerca de R$ 27,5 bilhões aos consumidores. O STJ vai analisar um recurso proposto por um consumidor contra a Companhia Estadual de Distribuição de Energia Elétrica (CEEE) do Rio Grande do Sul. No Estado, há mais de dez mil processos propostos por consumidores. A expectativa dos advogados que defendem o setor de energia é que o caso tenha o mesmo desfecho do recurso julgado ontem, envolvendo as concessionárias de telefonia.

Luiza de Carvalho, de Brasília

Transferência de bens do devedor, mesmo anterior à dívida, pode ser desfeita

STJ

A transferência de bens do devedor para se prevenir de uma futura execução pode ser desfeita pela Justiça mesmo que tenha ocorrido antes da constituição da dívida, bastando que se evidencie a intenção de fraude contra o credor. Com essa tese, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento a recurso especial interposto por um grupo de devedores de São Paulo e permitiu que a transferência de seus bens a terceiros seja declarada ineficaz.

Um dos autores da manobra era sócio de concessionária de veículos que, segundo informações do processo, cometeu várias irregularidades em contratos financeiros, em prejuízo do banco financiador. Descoberta a fraude, a empresa concordou em assinar documento de confissão de dívida e deu ao banco notas promissórias que não foram pagas.

Ainda segundo o processo, desde que as irregularidades começaram a ser apuradas, a família do sócio da empresa tratou de se desfazer dos bens que poderiam vir a ser penhorados em futura execução. Primeiro, o empresário e seus familiares próximos – comprometidos por aval com as notas promissórias – criaram duas empresas e transferiram seus imóveis a elas. Em seguida, cederam suas cotas societárias para empresas off-shore localizadas em um paraíso fiscal.

A ministra Nancy Andrighi, relatora do caso no STJ, observou que, em princípio, uma transferência de bens só pode ser considerada fraude contra o credor e, assim, desfeita pela Justiça, quando ocorre após a constituição da dívida. Em alguns casos, porém, segundo ela, a interpretação literal da lei não é suficiente para coibir a fraude.

“O intelecto ardiloso intenta – criativo como é – inovar nas práticas ilegais e manobras utilizadas com o intuito de escusar-se do pagamento ao credor. Um desses expedientes é o desfazimento antecipado de bens, já antevendo, num futuro próximo, o surgimento de dívidas, com vistas a afastar o requisito da anterioridade do crédito”, afirmou a ministra em seu voto.

Os demais integrantes da Terceira Turma concordaram com a posição da relatora, no sentido de relativizar a exigência da anterioridade do crédito sempre que ficar demonstrada a existência de fraude predeterminada para lesar credores futuros. Em seu voto, Nancy Andrighi ressaltou que o STJ já havia adotado esse entendimento pelo menos uma vez, em 1992, em recurso relatado pelo ministro Cláudio Santos.


REsp 1092134

STJ edita súmula sobre honorários sucumbenciais

Nova súmula do Superior Tribunal de Justiça (STJ) limita a cobrança de honorários de sucumbenciais, que são pagos aos advogados da parte vencedora no processo pela outra parte, quando estes são omitidos na decisão transitada em julgado. O projeto, que originou a Súmula 453, é de relatoria da ministra Eliana Calmon, na sessão da Corte Especial. A Súmula 453 tem como enunciado: “Os honorários sucumbenciais, quando omitidos em decisão transitada em julgado, não podem ser cobrados em execução ou em ação própria”.

Entre os fundamentos legais do novo resumo legal, estão o artigo 20 do Código de Processo Civil (CPC), que define os honorários de sucumbência e como o juiz decreta seus pagamentos. Outro fundamento foram os Artigos 463 e 535, também do CPC. O primeiro autoriza a mudança da sentença do juiz após a publicação de ofício ou embargos de declaração. O outro se refere a quando cabem esses embargos.

Um dos processos que foi usado como jurisprudência para a súmula foi o Recurso Especial 886178, relatado pelo ministro Luiz Fux. Nele, após o trânsito em julgado (julgamento final, sem mais recursos) de sentença, foi pedido a inclusão dos honorários de sucumbência.

Os advogados afirmaram que houve omissão no julgamento do juiz, por não determinar essas somas. No seu voto, o ministro apontou que a sucumbência decorre do fato objetivo da derrota do processo, devendo ser determinada pelo juiz. Para o ministro, após o trânsito da sentença, não se pode voltar atrás e condenar a parte perdedora a pagar tais honorários. Caso a parte vencedora não reclame antes disso, esse direito fica precluso.

No mesmo sentido, foi a decisão do ministro Aldir Passarinho Junior no Recurso Especial 237449. No caso, se discutia a verba sucumbencial honorária na execução de julgado. O ministro considerou que, se a parte não apresenta recurso no prazo adequado, não tem o direito de fazê-lo após. Também apontou que a omissão pelo juiz em fixar os honorários de sucumbência não tornaria o julgamento nulo.

Também foram usados como fundamentação para súmula, entre outros, os Recursos Especiais 661880, 747014, 352235 e o Agravo Regimental no Recurso Especial 886559.




STJ faz megajulgamento para bancos Planos Econômicos



O Superior Tribunal de Justiça (STJ) vai fazer, na quarta-feira, um megajulgamento sobre a possibilidade de os bancos serem responsabilizados pelo pagamento de bilhões de reais como correção dos planos econômicos Bresser, Verão, Collor 1 e Collor 2. Os ministros da 2ª Seção do STJ vão responder a quatro perguntas: quem deve ser responsável pela correção dos planos (os bancos ou o Banco Central); se as ações prescrevem (ficam extintas) em 20 anos; qual o índice de correção em cada plano; se a capitalização de juros deve ser mensal ou anual.

O STJ tem milhares de processos sobre essas quatro questões. Para conclui-los, o tribunal optou por pegar apenas dois recursos, em que estão todas essas questões, e julgá-los. A decisão, nestes dois casos, vai dar o parâmetro para os demais. Ou seja, se o STJ decidir que são os bancos que têm que pagar, todos os outros processos serão decididos dessa forma. Nessa hipótese, os bancos teriam de provisionar os valores a serem pagos nos seus balanços. Mas, se o STJ julgar que o BC é o responsável, será o governo que vai ter que pagar aos correntistas.

As quatro questões colocam os bancos e os consumidores em oposição frontal. "Nós defendemos que os bancos é que devem responder", afirmou a gerente-jurídica do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Maria Elisa Novais. "Eram os bancos que tinham a administração das contas, e não o BC."

Para a Federação Brasileira dos Bancos (Febraban), as instituições financeiras apenas seguiram normas do governo, na implementação de cada plano, e não poderiam ser responsabilizados por isso. No Plano Collor, por exemplo, os bancos corrigiram as poupanças pelo IPC, nos dois primeiros meses de vigência do plano, em março e abril de 1990. Mas, em maio, o BC fez a correção das poupanças que foram bloqueadas pelo governo Collor utilizando o BTNF, que era menor. "A responsabilidade (pela correção) ficou com o BC", enfatizou o diretor jurídico da Febraban, Antonio Carlos de Toledo Negrão.

A Febraban está utilizando uma decisão tomada em abril pelo próprio STJ para tentar vencer a segunda questão - se as ações envolvendo planos econômicos prescreveram em 20 anos. Naquele mês, o tribunal fixou em cinco anos o prazo para a extinção de ações coletivas dos poupadores. Com base nessa decisão, os bancos derrubaram 1015 ações, de um total de 1030. Só restaram 15. "O Idec vai querer reabrir essa discussão, mas, para nós, está superada", disse Negrão.

"O maior receio dos poupadores é esse entendimento recente do STJ sobre os cinco anos para a prescrição de ações civis públicas", admitiu Novais. Segundo ela, essa decisão é absolutamente contrária a outras que foram tomadas, antes, pelo tribunal.

A terceira questão é sobre qual índice deve ser aplicado em cada plano. "A jurisprudência do STJ é tranquila a favor do poupador nos planos Bresser e Verão", disse Novais. No caso do Plano Collor, há, segundo ela, uma diferença. Para valores que ficaram sob livre movimentação, o entendimento é favorável ao poupador, mas, no caso de valores bloqueados pelo governo Collor, é contrário. "Nós defendemos que seja mantida a jurisprudência do STJ", disse a advogado do Idec.

A Febraban fez um levantamento de vários planos e verificou que há casos em que os poupadores poderão receber muito mais se tiverem direito à correção dos índices. No caso do Plano Collor 2, por exemplo, a entidade avaliou que, se os poupadores tiverem a correção que pleiteiam e, depois, a determinada pelo governo, eles terão um ganho muito maior do que a inflação do período. "Eles deveriam ficar com o índice anterior, que caiu, ou com o novo índice determinado pelo governo. A conjugação de dois índices dá um ganho acima da inflação, gerando um enriquecimento sem causa", afirmou Negrão.

A quarta questão envolve a capitalização de juros. O STJ tem várias decisões em que fixou que essa capitalização deve ser contabilizada mensalmente apenas a partir de 2001, após a edição da Medida Provisória 1963. Antes de 2001, ela deve ser anual. "A jurisprudência do STJ é que a capitalização mensal é admitida em contratos celebrados a partir dessa MP, desde que pactuada entre as partes", explicou um integrante do tribunal.

"O que a gente entende é que os bancos não descumpriram os contratos no caso de capitalização de juros", disse Negrão. "Eles não podem ser penalizados com encargos moratórios pelo fato de não terem pago a correção na época de cada plano, pois tinham de cumprir os prazos fixados em lei."

"A questão da capitalização é algo tranquilo", respondeu Novais. "Ela é mensal. Assim é a jurisprudência do STJ. Estamos muito otimistas na adoção de entendimentos pacíficos do tribunal e trabalhamos para que a jurisprudência se confirme."

Juliano Basile, de Brasília
STJ

Entrou em vigor neste ano o novo Código de Ética Médica, depois de vinte anos de vigência do anterior. Segundo informações do conselho responsável pela classe, é um documento atento às determinações da medicina brasileira do século 21, bem como aos avanços tecnológicos, científicos, à autonomia e direitos do paciente.

Comporta ao todo 25 princípios fundamentais, entre os quais o de que a medicina não pode, em nenhuma circunstância, servir ao comércio. Princípios e diretrizes que trazem, em síntese, temas espinhosos para a rotina de profissionais que atuam constantemente sob pressão por resultados, pela manutenção do sigilo e pela cobrança por responsabilidades. Assuntos delicados que, inúmeras vezes, rompem a barreira dos consultórios e chegam aos tribunais. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) possui vasta jurisprudência sobre os diversos aspectos envolvendo o tema.

O médico, por exemplo, não deve revelar sigilo relacionado a paciente menor, inclusive a seus pais ou representantes, desde que esse tenha capacidade de discernimento e quando o segredo não acarreta dano ao paciente.

O profissional também não pode revelar informações confidenciais obtidas quando do exame de trabalhadores, inclusive por exigência dos dirigentes de empresas ou instituições, salvo se o silêncio colocar em risco a saúde dos demais empregados ou da comunidade. E, ainda, tem a obrigação de avisar ao trabalhador eventuais riscos à saúde advindos de sua atividade laboral.

É vedado, assim, revelar fatos obtidos por desempenho da função, salvo por motivo justo, dever legal ou consentimento por escrito. Na investigação de suspeita de crime, por exemplo, o médico estará impedido de revelar assuntos que possam expor o seu cliente a processo penal.

Essa é a situação de um caso a ser julgado pela Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em que a Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul pede o trancamento de investigação contra centenas de mulheres suspeitas de fazerem aborto em uma clínica de planejamento familiar, em Campo Grande (MS). O argumento é que a instauração do inquérito não é calcada em prova válida, já que as fichas médicas estariam acobertadas pelo sigilo.

A regra informa que, quando requisitado judicialmente, o prontuário é disponibilizado a um perito médico nomeado pelo juiz. O STJ já julgou inúmeros casos de solicitação de quebra de sigilo feita por requisição de autoridades judiciais. O sigilo, porém, não é absoluto e existe para proteger o paciente.

Foi esse o posicionamento da Corte em um processo em que a instituição se recusava a entregar o prontuário para atender a uma solicitação do Ministério Público, com vistas a apurar as causas de um acidente registrado como queda acidental. No curso de outra investigação criminal, em que o órgão solicitou informações para apuração de crime, a Segunda Turma decidiu que detalhes quanto ao internamento e período de estada para o tratamento não estão ao abrigo do sigilo.

O conselho também recomenda não permitir o manuseio e o conhecimento dos prontuários por pessoas não obrigadas à reserva profissional. O STJ tem julgados que asseguram que a simples entrega de prontuário médico sem autorização do paciente é fato que, por si só, gera dano moral (AG 1.064.345).

Em uma das ações, o Tribunal considerou que houve dano à viúva em consequência da entrega do prontuário do marido falecido à empresa seguradora responsável pelo plano de saúde do paciente. Os ministros, na ocasião, consideraram que houve violação à ética e que, no máximo, poderia ser fornecido um relatório justificando o tratamento e o tempo de permanência do segurado no hospital.

A Corte também considera que o profissional não pode deixar de expedir laudo quando o paciente for encaminhado para continuação de tratamento em outra unidade da federação. Julgado do STJ registra caso de uma paciente do Rio Grande do Sul que sofreu acidente nas ruas de Brasília e teve de recorrer à via judicial para ter acesso ao diagnóstico, bem como a todas as informações sobre o tratamento no período que ficou internada na cidade. Foram quase trinta dias de coma desassistida de familiares. Segundo o STJ, nesses casos o hospital responde pelo ônus da sucumbência – prejuízo por todos os custos com o processo, além de possíveis danos morais.

De acordo com o artigo 154 do Código Penal, a violação do segredo profissional gera detenção de três meses a 1 ano ou multa. Além de observar o sigilo, o médico deve observar o dever de informar o paciente e obter o seu consentimento a respeito de determinada conduta que pretende aplicar. São princípios também adotados pelo novo Código de Ética da Medicina brasileira. E, segundo o STJ, o médico que deixa de informar o risco de um procedimento recai em negligência e responde civilmente pelos danos decorrentes da lesão.

Exames complementares

Se o sigilo é um assunto que afeta a intimidade do paciente, a responsabilidade é uma questão que afeta diretamente a vida. A jurisprudência sobre o tema registra casos de médicos que, seja por negligência, imprudência ou imperícia, cometem erros graves no exercício da profissão, como inverter o laudo radiográfico na mesa cirúrgica e operar o lado oposto do cérebro do doente ou fazer tratamento para um tumor quando se tratava de uma infecção por vermes. Isso sem contar as agulhas esquecidas. De 2002 a 2008, por exemplo, a quantidade de processos envolvendo erro médico que chegaram ao STJ aumentou 200%.

Um diagnóstico errado acarreta um transtorno psicológico que gera danos morais, estéticos e patrimoniais, além de punição no âmbito penal e disciplinar. O STJ julgou responsável por má prestação de serviço laboratório que forneceu equivocadamente laudo positivo de uma doença sem a ressalva da exigência de exames complementares para comprovação dessa doença.

O Conselho Federal de Medicina recomenda, em seu Código de Ética, que nenhum médico pode se opor a uma segunda opinião e que o paciente tem o direito de ser encaminhado a outro profissional como forma de assegurar o tratamento. Uma estudante de Direito moveu ação de reparação de danos em razão de o laudo radiológico ter errado na formulação do diagnóstico: ela apresentava pneumonia dupla e o profissional ignorou o fato, causando graves consequências posteriores.

A responsabilidade médica, assim como acontece com outros profissionais liberais, é de meio, exceto nas cirurgias plásticas embelezadoras, em que o profissional se compromete com o resultado final. Isso porque o médico não pode garantir a cura, assim como o advogado não pode garantir uma causa, ou o publicitário, vendas líquidas e certas. Mas o médico deve agir com diligência, que é o agir com amor, cuidado e atenção – somada à perícia e ao conhecimento.

Segundo o autor Miguel Kfouri Neto, na publicação “Responsabilidade Civil do Médico”, os processos visando à apuração de responsabilidade por erro médico tem tramitação longa e são de difícil comprovação. “É recomendável que os juízes imprimam especial celeridade a esses feitos, colhendo as provas ainda na flagrância dos acontecimentos”, recomenda.

Os médicos, diferentemente dos hospitais, só respondem diante de culpa e mediante um nexo de causalidade (relação clara de causa e efeito). As instituições hospitalares têm a chamada responsabilidade objetiva, isto é, respondem independentemente de culpa ou nexo causal. De acordo com o Código do Consumidor, é o lesado quem deve provar o dano que tem nas relações contra os fornecedores de serviço, mas, no caso desses profissionais, não é assim que acontece.

Como, no caso, é o médico que detém o conhecimento necessário sobre o ato, o ônus da prova pode ser invertido, de modo que o prejudicado possa apenas apresentar o resultado danoso. De acordo com o STJ, essa inversão não é automática e cabe ao juiz justificá-la. (Resp 437.425)

Prazo de cinco anos

As ações para apuração de falhas médicas podem ser propostas perante os conselhos regionais, para as punições disciplinares, ou na Justiça comum, para punição no âmbito civil ou penal, no foro de domicílio do autor. O prazo para propô-las, de acordo com o Código de Defesa do Consumidor, é de cinco anos, embora o artigo 206, parágrafo 3º, inciso V, do Código Civil, imponha um prazo de três anos. Para eventos anteriores a 11 de janeiro de 2003, o prazo é de vinte anos.

Outra decisão importante do STJ sobre o tema “responsabilidade” é que a União não possui legitimidade para figurar no polo passivo de ação em que se objetiva danos morais decorrentes de erro médico ocorrido em hospital da rede privada, durante atendimento custeado pelo SUS.

Em contrapartida, a prestadora de serviços de plano de saúde tem legitimidade passiva para figurar em casos de indenização por erro médico. Foi o que garantiu uma decisão da Quarta Turma, em julho, em favor de uma paciente que foi internada para fazer coleta de um material num dos seios e teve as duas mamas retiradas sem o seu consentimento.

REsp 494206 - Resp 629212 - Resp 717900 - Resp 467878 - Ag1269116
Resp 605435 - Resp1051674 - Ag 818144 - Resp 696284 - RMS 14134 HC140123 - Resp 540048 - RMS 11453 - Resp 159527 - Ag 1064345
Resp 1133386 - Resp685929

Liminares suspendem tributação de hora extra

A Justiça Federal tem concedido, em primeira instância, liminares a empresas que suspendem a cobrança de contribuições previdenciárias sobre horas extras. As companhias decidiram questionar o pagamento depois de os tribunais superiores isentarem o chamado terço de férias. As decisões beneficiam contribuintes de São Paulo, Aracaju, João Pessoa, Juiz de Fora (MG) e Rio de Janeiro.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) julgava de forma contrária às empresas para a discussão sobre o terço de férias. Mas alterou seu entendimento depois de o Supremo Tribunal Federal (STF) analisar a questão. Os ministros da Corte decidiram em 2006, em um recurso de uma associação de servidores públicos, que o terço constitucional não tem natureza salarial e, portanto, não estaria sujeito à incidência das contribuições previdenciárias.

A partir desse entendimento, empresas têm entrado com ações na Justiça para suspender a cobrança e reaver o que já foi recolhido nos últimos cinco anos. Além disso, buscam no Judiciário cancelar o pagamento das contribuições previdenciárias sobre aviso prévio indenizado, valores pagos nos 15 primeiros dias de afastamento de empregados doentes ou acidentados e as horas extras.

O advogado Maurício Faro, do escritório Barbosa, Müssnich & Aragão, já obteve cinco liminares para livrar seus clientes do pagamento de contribuições sociais sobre as horas extras. Para ele, esse valores também não teriam natureza remuneratória para fins previdenciários.

Como as liminares não entram no mérito da discussão, ainda é cedo para afirmar que essa argumentação deve ser aceita pelo Judiciário. No entanto, segundo Faro, o Supremo tem um julgamento pendente, em caráter de repercussão geral, que pode estabelecer o que deve ser considerado remuneração para fins previdenciários. "Dependendo do resultado, a nossa tese deve ganhar mais força", afirma o advogado.

Adriana Aguiar, de São Paulo

Trabalhador tem preferência sobre hipoteca

Para garantir o pagamento de créditos trabalhistas de cerca de R$ 55 mil a uma ex-funcionária de um restaurante em São Paulo, o Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 2ª Região determinou a penhora de um sobrado hipotecado pela Caixa Econômica Federal (CEF), pertencente a um dos donos do estabelecimento.

Os desembargadores da 11ª Turma do TRT entenderam que o crédito alimentar se sobrepõe ao hipotecário, pois haveria, segundo a decisão, uma "discrepância de força econômica entre os dois credores", ao comparar a funcionária que ficou sem receber verbas trabalhistas e o banco detentor da hipoteca. Com o entendimento, o processo retornou para a 72ª Vara do Trabalho para o imóvel ser leiloado.

A trabalhadora foi defendida pelo Sindicato dos Empregados em Hospedagem e Gastronomia de São Paulo e Região (Sinthoresp). A entidade entrou com a ação na Justiça do Trabalho em 1999, pleiteando o pagamento de verbas rescisórias, depósitos fundiários, horas extras e multas correspondentes. Além do reconhecimento do vínculo empregatício, referente ao período em que trabalhou sem registro. A primeira instância reconheceu os direitos da trabalhadora e iniciou o processo de execução. No entanto, ao buscar bens, só localizou o imóvel hipotecado. A defesa do sócio do restaurante conseguiu reverter a penhora na primeira instância. No entanto, a trabalhadora ganhou no TRT, que remeteu o processo novamente para a vara responsável pela execução.

Segundo a gerente jurídica do setor de execuções do sindicato, Patrícia Damásio Khalil Ibrahim, o crédito alimentar tem que estar acima de qualquer crédito e já há decisões até no Tribunal Superior do Trabalho (TST) que confirmam esse posicionamento. Ela afirma que o sindicato tem utilizado essa mesma argumentação apresentada em outros processos, quando não são localizados outros bens. Segundo ela, em 60% dos casos, o sindicato tem conseguido a prioridade do crédito trabalhista sobre os demais. Hoje, o Sinthoresp tem cerca de sete mil processos de execução em andamento, de acordo com a gerente jurídica.

Procurada pelo Valor, a assessoria de imprensa da Caixa Econômica Federal, que não faz parte da ação principal, informou que a instituição ainda não foi notificada sobre a penhora do bem hipotecado. Mas se isso ocorrer, deverá tomar as providências necessárias para recuperar o crédito.

Adriana Aguiar, de São Paulo

Justiça veta reajuste em plano de idoso

A Justiça Federal de Minas Gerais vetou, em decisão de primeira instância, o aumento das mensalidades dos planos de saúde de idosos com mais de 60 anos. A decisão é valida para todo o Brasil, mas ainda cabe recurso.

O juiz Lincoln Pinheiro Costa, da 20ª Vara Federal, tomou a decisão em resposta a uma ação civil pública proposta pelo Ministério Público Federal. Ele tomou como base o Estatuto do Idoso, que proíbe a variação do valor do plano de saúde por faixa etária nos contratos dos clientes com mais de 60 anos.

Na decisão, o juiz ordena que a ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) altere a resolução que estabelece normas para o reajuste dos planos de saúde, para evitar que os idosos sejam prejudicados com aumentos.

O reajuste das mensalidades é uma prática recorrente, já que os mais velhos têm naturalmente mais doenças, utilizam os serviços médicos com frequência e, por isso, custam mais às operadoras.

A REGRA ATUAL
A resolução da ANS foi publicada em janeiro de 2004, logo após o Estatuto do Idoso entrar em vigor, em 2003. Diz que, nos contratos firmados a partir de 2004, não é possível reajustar o valor do plano quando o beneficiário completar 60 anos.

Na sentença, o juiz reforça que, pela resolução atual da ANS, apenas idosos que contrataram um plano de saúde após 2004 e que tenham completado 60 anos depois daquela data é que são protegidos pelo Estatuto.

Os demais -aqueles que já tinham plano de saúde e completaram 60 anos antes de a resolução entrar em vigor ou aqueles que firmaram o contrato antes de 2004 e completaram 60 anos depois disso- estariam desprotegidos. Para eles, o último reajuste na mensalidade pode ser aplicado aos 70 anos.

No entendimento do juiz, porém, "nenhum idoso, de todo o país, poderá ter sua mensalidade alterada apenas porque completou 60 anos". A sentença diz ainda que a ANS deverá exigir que as operadoras de plano de saúde cumpram o Estatuto.

OUTROS CASOS
Em 2008, o STJ (Superior Tribunal de Justiça), determinou que uma operadora de plano de saúde devolvesse em dobro, com correção monetária, um reajuste de 185% que aplicou às mensalidades de uma aposentada quando ela completou 60 anos. Ela tinha contratado o plano de saúde em 2001.

A decisão do STJ também se baseou no Estatuto do Idoso e abriu precedente para que juízes e outros tribunais seguissem na mesma linha.

A ANS informou que já recorreu da decisão. Segundo a agência, as regras atuais não mudam até que a ação seja julgada na última instância.

FERNANDA BASSETTE
RICARDO WESTIN
DE SÃO PAULO

Advogado pode receber honorário por cartão

Os 632 mil advogados do país já podem receber honorários por meio de cartão de débito ou de crédito. O Órgão Especial do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) decidiu ontem que o uso dessas formas de pagamento não configura infração ético-disciplinar. O entendimento foi adotado pela maioria dos 27 conselheiros, que analisaram uma consulta formulada pela seccional baiana da entidade.

A questão chegou ao Conselho Federal da OAB depois de a seccional paulista aprovar, em junho, o uso de cartão de crédito. O tema estava na pauta de outras regionais. O relator da matéria, Luiz Carlos Levenzon, conselheiro pelo Rio Grande do Sul, foi vencido na votação. Ele foi contra a adoção das máquinas nos escritórios, apesar de o Estatuto da Advocacia - Lei nº 8.906, de 1994 - e o Código de Ética e Disciplina da OAB não proibirem expressamente a prática. Ele entende que a utilização de cartões mercantiliza a profissão.

O voto divergente, seguido pela maioria, foi do conselheiro Miguel Cançado, representante de Goiás. "Não há como fugir. São apenas novas formas de pagamento de honorários", diz o advogado, acrescentando que o cheque, aceito pelos escritórios, está sendo substituído gradativamente pelo dinheiro de plástico.

Cançado alerta, no entanto, que os escritórios não podem usar a informação de que aceitam cartões como uma forma de captação de clientes, o que violaria o código de ética da categoria. "O profissional deve seguir o que determina o Provimento 94, que trata da publicidade na advocacia."

Arthur Rosa, de São Paulo




Afastada penhora de poupança para pagar dívida trabalhista

TST

A Seção II Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho afastou a penhora de conta poupança de ex-sócia da empresa A. I., C., R. e C. de A. C. em processo de execução. A SDI-2 seguiu, à unanimidade, entendimento do relator do recurso, ministro Renato de Lacerda Paiva.

Na interpretação do relator, os depósitos da conta poupança da ex-sócia são bens absolutamente impenhoráveis, nos termos do artigo 649, X, do CPC. Esse dispositivo estabelece como impenhorável a quantia depositada em caderneta de poupança até o limite de quarenta salários-mínimos e, na hipótese, o valor bloqueado foi de apenas R$ 208,58 (duzentos e oito reais e cinquenta e oito centavos).

O Tribunal do Trabalho gaúcho (4ª Região) tinha rejeitado o pedido de desbloqueio dos valores dos depósitos da poupança formulado pela ex-sócia em mandado de segurança. Para o TRT, a norma do CPC é incompatível com os princípios do Processo do Trabalho, em que deve prevalecer o interesse do empregado na qualidade de credor.

No entanto, diferentemente da opinião do Regional, o ministro Renato Paiva esclareceu que não se aplica ao caso o item I da Súmula nº 417 do TST, segundo o qual não fere direito líquido e certo do impetrante o ato judicial que determina a penhora em dinheiro existente em sua conta-corrente, em execução definitiva, para garantir os créditos trabalhistas exequendos, uma vez que obedece à ordem preferencial estabelecida no artigo 655 do CPC.

De acordo com o relator, de fato, não se pode admitir como regular a ordem de bloqueio de conta poupança quando o crédito nela constante é inferior a quarenta salários-mínimos, do contrário haveria desrespeito à regra do CPC que prevê a impenhorabilidade desses valores.

(RO-186900-46.2009.5.04.0000)

Verba que não constou de termo de rescisão pode ser pleiteada na Justiça

TST
Verba trabalhista não consignada em recibo de quitação pode ser postulada na Justiça do Trabalho, ainda que o empregado estivesse assistido pelo sindicato de sua categoria no momento da rescisão. Este foi o entendimento da Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, ao dar provimento ao recurso de revista de ex-funcionário da T. N. L. S.A.

Após sua dispensa, um ex-funcionário da empresa propôs ação trabalhista para obter reflexos de horas extras sobre repouso semanal remunerado - parcela não consignada no Termo de Rescisão Contratual, assinado com a assistência do sindicato.

O juiz de primeiro grau concedeu o pedido ao trabalhador e a T. recorreu ao Tribunal Regional do Trabalho da 7ª Região (CE), alegando ofensa à Súmula 330 do TST. A Súmula reproduz o entendimento de que a quitação passada pelo empregado, com assistência da entidade sindical de sua categoria, tem eficácia liberatória em relação às parcelas expressamente consignadas no recibo, salvo se oposta ressalva expressa e especificada ao valor dado à parcela ou parcelas impugnadas. Segundo o Item I do verbete sumular, a quitação não abrange parcelas não consignadas no recibo de quitação e, consequentemente, seus reflexos em outras parcelas, ainda que estas constem desse recibo.

O TRT, ao julgar o recurso da empresa, reformou a sentença e considerou indevido o reflexo das horas extras. Da Súmula 330, o regional entendeu que somente as parcelas com ressalvas poderiam ser questionadas na justiça, diferente do caso em questão, em que, segundo o TRT, as ressalvas existentes não se referiram às horas extras.

Contra isso, o ex-funcionário interpôs recurso de revista ao TST. O relator do processo na Quinta Turma, ministro Emmanoel Pereira, concluiu que o TRT decidiu contra a jurisprudência do TST. O relator apresentou decisões no sentido de que a quitação abrangeria tão somente as parcelas expressamente consignadas no recibo. Assim, de acordo com o artigo 477, §2.º, da CLT e com a Súmula 330, se as horas extras não constaram no termo de rescisão, não haveria impedimento para que tais verbas fossem pleiteadas na justiça trabalhista.

Com esses fundamentos, a Quinta Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso de revista do trabalhador para restabelecer a sentença.

(RR-177400-44.2001.5.07.0002)

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Cooperativas derrubam cobrança do Funrural

Três cooperativas paranaenses conseguiram suspender na Justiça a cobrança da contribuição ao Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural (Funrural), declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em fevereiro. A sentença, proferida pelo juiz Antônio César Bochenek, da 2ª Vara Federal de Ponta Grossa, beneficia as cooperativas Batavo, Castrolanda e Capal, que podem deixar de reter e recolher o tributo de aproximadamente dois mil produtores rurais.

Na decisão, além de seguir o entendimento do Supremo e reconhecer a inconstitucionalidade do artigo 1º da Lei nº 8.540, de 1992 - alterado pela Lei nº 9.528, de 1997 -, o magistrado analisou a redação dada pela Lei nº 10.256, de 2001. A norma não foi julgada pelo tribunal superior que, de acordo com a Fazenda Nacional, só teria isentado o contribuinte do recolhimento do Funrural no período de 1992 a 2001. O juiz considerou, no entanto, que o texto "não promoveu qualquer alteração em relação à base de cálculo" do tributo.

Para o magistrado, "a Lei nº 10.256, de 2001, posto que posterior à Emenda Constitucional nº 20/98, não teve o condão de instituir a receita bruta proveniente da comercialização da produção dos empregadores rurais pessoa física como base de cálculo da contribuição". Portanto, segundo ele, "não há como deixar de assentar que a nova fonte deveria estar estabelecida em lei complementar".

A decisão é um precedente importante para os produtores rurais e as empresas que adquirem a produção agrícola - principalmente os frigoríficos -, que disputam os bilhões do Funrural recolhidos indevidamente. Eles argumentam que a decisão do Supremo decretou o fim da contribuição, que só poderia ser novamente instituída por outra lei. E que norma de 2001 também seria inconstitucional porque não alterou significativamente a anterior, de 1997. Para a Fazenda Nacional, no entanto, a Emenda Constitucional nº 20, de 1998, permitiu a cobrança do tributo, que passou a ser disciplinado, a partir de 2001, pela Lei nº 10.256. A disputa pode representar uma perda de R$ 2,8 bilhões por ano ao governo federal.

Além de derrubar a cobrança, o magistrado reconheceu que "os valores retidos e recolhidos indevidamente à Fazenda Pública pertencem aos produtores rurais". "Na ação, não pedimos a restituição dos valores cobrados ao longo dos anos. Como a contribuição era paga pelo produtor, é ele que deve pedir a devolução do imposto", diz o advogado James Marins, sócio do escritório Marins Bertoldi Advogados Associados, que defende as cooperativas. Ele, aconselha, no entanto, que o tributo seja depositado em juízo até o fim da demanda.

Recentemente, a Fazenda Nacional conseguiu suspender uma liminar no Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região, que havia sido concedida à Associação dos Produtores de Soja e Milho do Mato Grosso (Aprosoja). A entidade representa dois mil produtores. Foi a primeira vitória do Fisco na tentativa de conter as liminares e sentenças concedidas pela primeira instância da Justiça Federal.

Arthur Rosa, de São Paulo

Protestos trabalhistas somam R$ 11 mi em SP

A Justiça do Trabalho de São Paulo pode, hoje, encaminhar para protesto as dívidas trabalhistas não pagas pelas empresas a seus funcionários. O objetivo do mecanismo é liquidar os processos e coibir o adiamento dos pagamentos. A prática tem apenas três meses de funcionamento, mas vem crescendo e já preocupa as empresas do País. Em São Paulo (capital, Baixada Santista e Grande São Paulo), por meio de convênio do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região com o Instituto de Protesto de Títulos de São Paulo, os juízes podem emitir as certidões de crédito trabalhista e enviar os pedidos de protesto pela internet - o que ocorre apenas em decisões transitadas em julgado, ou seja, quando não cabem mais recursos.

Maria Cristina Trentini, juíza auxiliar da presidência do TRT-SP, explica que a ferramenta, que deve ser usada como última medida para recebimento do crédito (quando não foram encontrados bens, rendas ou ativos financeiros), foi criada para tirar o devedor da "zona de conforto" e já tem dado resultados positivos. Segundo ela, em três meses, foram emitidas na 2ª Região 276 certidões de crédito, no valor total de R$ 11,6 milhões. O pagamento, no entanto, foi feito em apenas 5% dos casos, montante que chegou a R$ 56,8 mil. O restante, vai a protesto. "O pagamento de pequenos valores é mais fácil. Esperamos um grande número de devedores com poucas ações na Justiça".

A juíza diz, ainda, que a expectativa é aumentar o índice de solução das decisões. "Tínhamos sentenças que não chegavam a lugar algum, sem efetividade. Eram percorridos todos os caminhos e o devedor não sofria restrições. Agora a Justiça terá mais eficácia", ressalta a magistrada.

José Carlos Alves, presidente da seção São Paulo do Instituto de Estudos de Protesto de Títulos do Brasil, afirma que, quando o cartório recebe o pedido de protesto do juiz, intima a empresa para fazer o pagamento em três dias. Se o pagamento não for feito, o título vai a protesto. Segundo ele, em até dois meses a prática será ampliada para todo o estado.

A especialista em Direito Trabalhista, Luciana Arduin Fonseca, sócia do escritório Leite, Tosto e Barros Advogados, explica que com o titulo em cartório a empresa poderá sofrer sanções como a não participação em licitações do poder público, além da não obtenção de empréstimos e financiamentos. O advogado Euclydes José Mendonça, vice-presidente do Instituto dos Advogados de São Paulo (Iasp), afirma que essa é uma medida extrema. "Não acho que deveria ser feita por iniciativa do juiz. Esse é um remédio amargo para o problema que é a execução trabalhista", diz. Segundo ele, o prazo para que o trabalhador consiga receber seu crédito pode passar de dez anos. Mendonça acredita que o protesto pode ser usado indistintamente, como ocorre hoje com a penhora. "A medida é correta, mas pode criar um mecanismo desproporcional". Para ele, as pequenas empresas serão as mais prejudicadas por perderem imediatamente o crédito. Gláucia Soares Massoni, sócia do Fragata e Antunes Advogados, lembra que o protesto também atinge os sócios. "Ainda é cedo, mas deve haver uma avalanche de pedidos. As empresas devem se preocupar", diz. Ela afirma, ainda, que o provimento do TRT prevê que processos arquivados com débitos sejam reativados. "Vão ser ressuscitadas dívidas antigas que as empresas nem sabiam que existiam. As pequenas empresas não têm contingenciamento para isso", diz.

Andréia Henriques

Separação pede novos contratos

FOLHA DE S. PAULO - IMÓVEIS - 8.8.10

As dores de cabeça de um casamento malsucedido podem não terminar com o divórcio. Após a separação, muitos casais continuam unidos por contratos imobiliários com financiadoras ou locadoras de imóveis.

A desatualização desses contratos pode criar problemas tanto para o cônjuge que não ficou com o imóvel como para seus fiadores.

Ao decidir pela separação, o casal deve avaliar todos os contratos imobiliários. "Em caso de aluguel, a preocupação é maior", afirma o advogado Paulo Ribeiro.

"O casal tem a obrigação de avisar ao proprietário do imóvel e ao fiador que está se separando, e a notificação deve ser feita oficialmente.

De acordo com a Lei do Inquilinato (n.º 12.112/2009), que entrou em vigor neste ano, em caso de divórcio dos locatários, o fiador tem até 30 dias para se exonerar da obrigação caso se sinta ameaçado, mesmo que o contrato esteja no período de vigência.

"Define-se por qual dos dois o imóvel será ocupado", explica Jacques Bushatsky, diretor de Legislação do Inquilinato do Secovi-SP (sindicato do setor imobiliário).

Para Ribeiro, em caso de divórcio, é recomendável firmar um novo contrato, e não apenas alterar o que já existe. Se houver alteração no fiador, o cônjuge que seguir no imóvel tem 30 dias para encontrar nova fiança.

DIFICULDADE
A burocracia para partilhar um imóvel adquirido em conjunto leva muitos a não se separarem contratualmente, segundo especialistas ouvidos pela Folha.

A separação de bens é um processo à parte do divórcio. A alteração na lei que extinguiu os prazos de prévia separação judicial, em vigor desde 13 de julho, não muda nada na hora da partilha.

QUITAÇÃO DO BEM E VENDA É SOLUÇÃO
O publicitário Carlos Souza, 38, separou-se ano passado, mas ainda tinha o financiamento de um apartamento para quitar com a ex-mulher.

A dívida era de cerca de 30% do valor do crédito. "Procuramos a financiadora, avisamos que estávamos em processo de separação, quitamos e vendemos", conta.

Na transação obtiveram o dobro do preço pago pelo imóvel, o suficiente para a aquisição de seu novo apartamento.

Financiamentos não preveem divórcio

No primeiro semestre deste ano, houve 6.019 divórcios só nos 12 fóruns regionais da capital paulista e no Fórum Central João Mendes, de acordo com dados do Tribunal da Justiça de São Paulo.

Ainda assim, especialistas consultados pela Folha dizem que grande parte dos contratos imobiliários não exibem cláusulas específicas sobre divórcio.

Em caso de separação, contudo, o casal tem a obrigação de comunicá-lo à financiadora, mesmo que a medida não esteja prevista em contrato.

"Quem opta por ficar com o imóvel tem de assumir a dívida e comunicar a decisão à financiadora, pois, se houver falta de pagamento, os dois terão o nome sujo", afirma o advogado Michel Rosenthal Wagner, especialista na área de imóveis e contratos.

"O indicado é que um compre a parte do outro ou que o imóvel seja vendido, mas para isso é preciso quitar o valor total da dívida", explica o advogado Paulo Ribeiro.

RENDA
Na hora do financiamento, o mais comum é que o crédito seja dado em nome do casal, já que "quanto mais pessoas para comprovar a renda, maior o valor liberado", aponta o advogado imobiliário Marcelo Manhães.

Quando ocorre a separação ou a definição de quem vai assumir o financiamento, o banco faz uma nova avaliação de crédito para confirmar se a nova renda informada é suficiente para assumir o financiamento integral.

Se um dos cônjuges quiser assumir a dívida, ele pode pedir um novo contrato e solicitar ao banco uma extensão no prazo de pagamento do valor residual.

"Mas esse não é um processo simples. É preciso comprovar a renda para o refinanciamento", informa o superintendente da área imobiliária do banco Santander Fernando Baumeir.

Caso a renda não seja aprovada, a dívida deverá ser quitada ou transferida. Enquanto não for feita a atualização do contrato, as parcelas já existentes devem ser pagas normalmente.

"Se houver falta de pagamento, a dívida será executada mesmo com a negociação em andamento e o casal pode ficar com o nome sujo", completa Wagner.

APÓS O DIVÓRCIO VEJA COMO RESOLVER CONTRATOS

Locatários
-O casal deve notificar o proprietário e o fiador -por carta, sempre com prova de entrega- e pedir um novo contrato em nome do cônjuge que permanecerá no imóvel

-O fiador pode pedir exoneração do cargo, caso se sinta ameaçado pela diminuição da renda do locatário, em até 30 dias após a notificação

-Se o fiador for exonerado, o locatário tem um mês para trocar de fiança

-O proprietário não pode pedir a desocupação do imóvel durante o período de contrato vigente, apenas se houver atraso no pagamento ou se os inquilinos ficarem sem fiador

Fiadores
-O casal deve notificar o proprietário do imóvel e o inquilino e pode pedir exoneração do cargo no período de contrato vigente. Se os inquilinos não aceitarem, o caso terá de ser decidido na Justiça

Imóvel financiado
-O casal deve comunicar o divórcio à financiadora para que seja feito um acordo de quem vai assumir a dívida ou se o valor restante será quitado

-Se um dos cônjuges quiser assumir o financiamento, pode solicitar ao banco uma extensão no prazo de pagamento ou o refinanciamento da dívida

Fiadora fica com dívida após separação de locatários

Há três anos, Valéria Quedas, 41, e seu marido foram fiadores de um casal que vivia em união estável. Após receber uma cobrança no valor de R$ 15 mil em sua casa, ela descobriu que eles não estavam mais juntos.

"Fui procurar os inquilinos e descobri que eles haviam se separado. O meu nome está na Serasa, nossa casa foi penhorada, e as contas bancárias, bloqueadas", diz.

Como a imobiliária não a avisou sobre a dívida conforme se havia atrasos de pagamento, essa é a linha de defesa que adotará. "O casal fez acordo com a imobiliária para pagar aluguéis atrasados sem nos comunicar", conta.

Seu contrato é anterior à nova Lei do Inquilinato, por isso não havia a possibilidade de se exonerar da obrigação devido ao divórcio.

A lei anterior não previa qualquer proteção ao fiador, a quem cabe a responsabilidade sobre pagamentos de aluguel não efetuados.

Sob as novas regras, Quedas poderia usar o desconhecimento da separação do casal para se proteger.

Ela aguarda a resolução do caso na Justiça e espera que o valor da dívida -hoje, R$ 22 mil- seja reduzido.

ADRIANA ABREU
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Casais homossexuais conquistam na Justiça o direito à união estável

VALOR ECONÔMICO - LEGISLAÇÃO & TRIBUTOS

O Brasil, ao contrário de muitos países, ainda não conseguiu aprovar uma lei que permita a união estável para casais homossexuais, apesar de haver 17 projetos de lei sobre o assunto em tramitação no Congresso Nacional. Diante da morosidade do Poder Legislativo - que começou a discutir o assunto em 1995 -, os direitos civis desses casais estão sendo conquistados no Judiciário. Pelo menos 10 tribunais estaduais e o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já admitiram haver união estável entre casais de mesmo sexo em seus julgados.

Partindo do reconhecimento dessa união, magistrados já concederam a homossexuais pensão por morte, inclusão em plano de saúde como dependente e participação em herança. Também já autorizaram a adoção de crianças por casais de mesmo sexo. A primeira adoção foi admitida pelo STJ em abril deste ano. No caso, uma das mulheres já havia adotado duas crianças ainda bebês. E sua companheira, com quem vive desde 1998, queria também figurar como mãe no registro dos menores. Ao analisar o processo, os ministros da 4ª Turma foram unânimes em manter a decisão favorável ao casal proferida pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS). Para eles, na adoção deve prevalecer sempre o melhor para a criança. E, nesse caso, os laços afetivos entre as crianças e as mulheres são "incontroversos".

Desde 1998, o STJ vem reconhecendo a união estável entre homossexuais. Mas só dez anos depois, em 2008, é que a Corte passou a analisar o tema como direito de família, e não como direito patrimonial. O primeiro caso envolve um engenheiro agrônomo brasileiro que vivia há 20 anos com um canadense. Eles buscaram a declaração de união estável para obter visto permanente para o estrangeiro. Na época, a votação foi apertada em três votos a dois, a favor do reconhecimento. No entanto, o Ministério Público Federal (MPF) resolveu contestar a decisão. Como o caso está pendente de julgamento, o canadense decidiu regularizar sua situação no Brasil por outra via, com visto de trabalho.

O tema já chegou, inclusive, no Supremo Tribunal Federal (STF). A Procuradoria Geral da República (PGR) defende em uma ação direta de inconstitucionalidade (Adin), ajuizada no ano passado, que o não reconhecimento da união entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar estaria desrespeitando os princípios da dignidade da pessoa humana, da igualdade, da vedação de discriminações odiosas, da liberdade e da proteção à segurança jurídica. O caso foi levado diretamente ao Plenário da Corte.

Para a advogada e vice-presidente do Instituto Brasileiro da Família, Maria Berenice Dias, apesar de não haver ainda um posicionamento do Supremo, é irreversível o avanço conquistado pelos casais homossuexuais na Justiça. Ela, que já foi juíza e desembargadora no Rio Grande do Sul, já julgou diversos processos sobre o tema. Entre os casos emblemáticos, um que trata do direito de herança a um parceiro homossexual no Tribunal de Justiça gaúcho. Após uma relação que durou 47 anos, o companheiro teve que entrar na Justiça para brigar com o Estado pelo seu direito à herança, já que o falecido não tinha parentes. No fim, em um julgamento apertado, a Corte estadual reconheceu a união e o direito à herança. Porém, o caso ainda está pendente de recursos nos tribunais superiores.

Mas, ainda que haja diversas decisões favoráveis na Justiça, somente uma lei poderia assegurar esses direitos civis a todos os casais homossexuais, segundo Maria Berenice Dias. Ela afirma que isso seria fundamental para encerrar de vez a polêmica sobre o reconhecimento da união estável. "Até para que esses casais não dependam da interpretação de juízes, órgãos da administração ou de empresas. Sem uma regulamentação formal, ainda há uma enorme dificuldade", diz.

Como a Constituição e o Código Civil apenas admitem a união estável entre homem e mulher, uma simples alteração nesses termos bastaria para que essas relações homoafetivas pudessem ser reconhecidas. E essa mudança aparentemente simples poderia até diminuir o preconceito existente, segundo advogada e professora de direito de família do Mackenzie, Ana Scalquette. Assim como ocorreu com a regularização do divórcio ou da união estável.

Para a professora, o país tem caminhado para o reconhecimento de um novo núcleo familiar, sem o formalismo de um casamento, como ocorreu na Argentina, mas onde se admite a união estável. Para ela, " independentemente de religião, dogmas e preceitos, o Estado tem que tratar todos de forma igual, sem distinção". A advogada Regina Beatriz Tavares da Silva, presidente da Comissão de Direito de Família do Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP), também entende que é oportuna a aprovação de uma lei que permita a união estável para casais homossexuais, desde que não contrariem as normas de ordem pública e os bons costumes. Para ela, seria importante fazer essa ressalva para que cada juiz decida dentro do contexto existente em cada cidade brasileira, respeitando a diversidade cultural.

Companheiro pode ser incluído no IR

O governo federal garantiu este ano alguns direitos aos casais de mesmo sexo. O Ministério da Fazenda aprovou em julho um parecer da Procuradoria-Geralda Fazenda Nacional (PGFN) que dá direito a homossexuais de incluir o companheiro ou companheira como dependente no Imposto de Renda. Os casais podem retificar as declarações dos últimos cinco anos.

Em junho, a Advocacia-Geral da União (AGU) admitiu que a união homoafetiva estável dá direito ao trabalhador do setor privado de receber benefícios previdenciários. E o Ministério de Relações Exteriores passou a emitir passaportes diplomáticos para companheiros de servidores que trabalham nas representações do Brasil no exterior. Desde 2006, o órgão concede assistência médica a parceiros homossexuais.

Para o presidente da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT), Toni Reis, além das conquistas obtidas no Judiciário e no Executivo, foi estabelecido um plano na Conferência Nacional de Políticas Públicas para Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais (GLBTT), que ocorre desde 2008, com 180 ações para serem colocadas em prática em 18 ministérios. Em geral, são movimentos para diminuir o preconceito e melhorar a integração.

Na esfera legislativa, Reis informa que foi formada uma Frente Parlamentar pela Cidadania GLBT, que reúne em torno de 240 parlamentares federais. E que a associação agora está empenhada em aprovar o projeto de lei nº 4.914, de 2009, assinado por 11 parlamentares de partidos diferentes. A proposta, que tramita na Câmara dos Deputados e ainda tem que passar pelo Senado Federal, altera o Código Civil e estabelece a união estável para casais homossexuais. O presidente da entidade afirma que tem esperança de que seja aprovada em breve uma lei sobre o tema. "Não queremos destruir a família de ninguém, só queremos construir a nossa família, com direitos iguais".

Parceiras querem ter seus nomes em certidões de nascimento de gêmeos

Adriana Tito Maciel e Munira Khalil El Orra estão juntas há quatro anos. E, há quase dois anos, as duas pleiteiam na Justiça paulista o direito de registrar como mãe os gêmeos Eduardo e Ana Luiza, de um ano e três meses.

Adriana gerou os bebês que, por enquanto, estão registrados apenas em seu nome. Mas Munira doou os óvulos para fazer a inseminação artificial. Esse é provavelmente o primeiro caso na Justiça em que figuram a mãe biológica e a mãe que gerou as crianças.

A advogada do casal, Maria Berenice Dias, do Maria Berenice Dias Advogados, entrou com o processo antes dos bebês nascerem. Para Adriana, a ideia era já registrar no nome das duas. "Mas como isso não ocorreu em tempo, tive que registrar sozinha", afirma. Essa situação já provocou alguns transtornos para Munira, que ainda não é oficialmente mãe dos gêmeos. Eduardo nasceu com uma síndrome rara e precisa de tratamento, mas Munira não pode viajar com ele sem autorização expressa de Adriana. "Na AACD, onde o Eduardo faz tratamento, eles entenderam a situação e foram solidários. Por isso, Munira pode acompanhar nosso filho", diz Adriana. Porém, segundo ela, " fica complicado para Munira ter que provar o tempo todo que também é mãe das crianças".

Para Adriana, a família que elas construíram é igual a todas as outras. Elas moram na casa ao lado da sua mãe e do seu irmão. E a mãe de Munira vai sempre visitá-las no fim de semana. "O direito tem que ser igual para todos. A igualdade tem que prevalecer", afirma. Segundo Adriana, as duas dividem tudo, " de responsabilidades a fraldas". "Tudo isso tem que ser encarado com naturalidade. Temos um enorme carinho pelas crianças. A Ana já nos chama de mãe."

Adriana Aguiar, de São Paulo

domingo, 8 de agosto de 2010

Nova regra da Receita vale a partir de outubro

VALOR ECONÔMICO - BRASIL

Os brasileiros em viagem ao exterior ficarão desobrigados de preencher a "Declaração de saída temporária de bens" a partir de outubro, conforme a Instrução Normativa nº 1.059 da Receita Federal. Divulgada ontem, ela altera os procedimentos de controle aduaneiro e fiscalização de bens de viajantes que ingressam no país.

As novas regras definem os conceitos de bens de uso pessoal (artigos de vestuário, higiene e bens de caráter pessoal) e de bagagem (artefatos novos ou usados para uso pessoal ou para presentear que, pela quantidade, natureza ou variedade, não se destinam a fins comerciais ou industriais). Com isso, a partir de 1º de outubro a Receita classificará relógio, aparelhos celulares e máquinas fotográficas como bens de uso pessoal. Um item de cada um deles poderá entrar no país fora da cota e os demais deverão obedecer às cotas de importação de US$ 500 (via aérea e marítima) e de US$ 300 (via terrestre, fluvial e lacustre).

O subsecretário de Aduana, Fausto Vieira, explicou que se um fiscal identificar um brasileiro em ingresso no país portando cinco relógios, um será considerado dele, desde que em uso pessoal; outros três serão aceitos desde que nos limites das cotas; e o quinto será apreendido por caracterizar mercadoria com fins comerciais.

Notebooks, filmadoras e máquinas que exigem instalação continuam sujeitos às cotas.

Luciana Otoni, de Brasília

Presidente concede liminar para evitar prisão civil de depositário infiel

STJ

Presidente concede liminar para evitar prisão civil de depositário infiel
É incabível a prisão civil do devedor em contratos de alienação fiduciária, pois não podem ser aplicadas, ao caso, as regras do contrato de depósito típico. A observação foi feita pelo presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Cesar Asfor Rocha, ao conceder liminar para afastar a possibilidade de prisão civil em ação de depósito, em Campo Grande (MS).

O habeas corpus com pedido de liminar foi impetrado após decisão do Tribunal de Justiça estadual (TJMS) que deu provimento à apelação contra o depositário infiel, para acrescentar à sentença o seguinte trecho: “Se o requerido não entregar o bem ou o equivalente em dinheiro, contra ele será expedido mandado de prisão, por infidelidade no encargo de depositário, conforme previsão contida no parágrafo único do artigo 904 do Código de Processo Civil”.

A defesa requereu, na liminar, alvará de soltura em favor do paciente, preso por força de contrato de alienação fiduciária convertida em depósito, nos autos de processo que tramita na Décima Vara Cível da Comarca de Campo Grande. Afirmou que, na fase de execução de sentença, o juiz intimou o paciente para que entregasse o bem ou seu equivalente em dinheiro, sob pena de imediato decreto de prisão civil, considerando-o depositário infiel.

A liminar foi concedida. Segundo lembrou o ministro Cesar Rocha, o tema é objeto da Súmula Vinculante n. 25 do Supremo Tribunal Federal, que dispõe que “é ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito”.

“Ante o exposto, concedo a liminar para afastar a possibilidade de prisão civil do paciente nos autos da ação de depósito 001.04.128633-3, da 2ª Vara Cível Residual da Comarca de Campo Grande (MS), até o julgamento do mérito do presente habeas corpus”, concluiu o presidente.

Após o envio das informações solicitadas ao TJMS e ao juiz de origem de primeiro grau, o processo segue para o Ministério Público Federal, que dará parecer sobre o caso. Em seguida, retorna ao STJ, onde será julgado pela Quarta Turma. O relator é o desembargador convocado Honildo de Mello Castro.

HC 175238

Distribuidoras de energia estimam prejuízo de R$ 27 bi

VALOR ECONÔMICO - LEGISLAÇÃO & TRIBUTOS

As distribuidoras de energia do país podem ter que devolver cerca de R$ 27,5 bilhões aos consumidores caso percam no Superior Tribunal de Justiça (STJ) a disputa sobre a legalidade do repasse do PIS e da Cofins nas tarifas de energia. A controvérsia será julgada com status de recurso repetitivo pela 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ). A Corte analisará um recurso proposto por um consumidor contra a Companhia Estadual de Distribuição de Energia Elétrica (CEEE) do Rio Grande do Sul. A decisão deve influenciar o julgamento de milhares de processos semelhantes que tiveram o andamento suspenso anteontem, após decisão do ministro do STJ, Teori Zavascki, relator do recurso. Somente no Rio Grande do Sul, há mais de dez mil processos propostos por consumidores.

O valor da disputa foi estimado a partir do faturamento anual de R$ 100 bilhões das distribuidoras, de acordo com a Associação Brasileira dos Distribuidores de Energia Elétrica (Abrade). Para o cálculo, considerou-se a incidência média do PIS e da Cofins de 5,5%. O valor do repasse aos consumidores, caso percam a disputa, corresponderia a R$ 5, 5 bilhões anuais - os usuários podem pleitear o reembolso dos últimos cinco anos.

O setor de telefonia enfrenta a mesma batalha no STJ. A 1ª Seção analisa o recurso de um consumidor contra a Brasil Telecom. Segundo a empresa, seriam necessários R$ 2,1 bilhões caso seja obrigada a reembolsar o PIS e a Cofins aos consumidores relativo ao período de 1996 a 2000. O julgamento está suspenso por um pedido de vista. Até agora os consumidores vencem a disputa por um placar de quatro votos a dois.

As distribuidoras de energia lutam para provar no STJ que a decisão a ser tomada no caso da telefonia não deve ser aplicada ao setor. Este mês, o ministro Herman Benjamin, que havia dado uma decisão no sentido de equiparar os casos, mudou de ideia após recurso da Rio Grande Energia. De acordo com o assessor jurídico da Abrade, Braz Pesce Russo, o caso das distribuidoras de energia é bem diferente daquele envolvendo a telefonia. Segundo ele, os tributos estão entre as despesas necessárias à prestação do serviço, são componentes da tarifa. No caso das teles, afirma, o PIS e a Cofins funcionariam como uma tributação em cima do valor da tarifa. "As distribuidoras de energia fazem um repasse econômico do tributo, enquanto as teles fazem um repasse jurídico", diz Russo.

Na opinião do advogado, caso haja um desfecho desfavorável às distribuidoras no STJ, o valor dos tributos terão que ser repostos às empresas pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), que deve repassar o custo novamente ao consumidor.

O ministro Zavascki convidou para a atuação como amicus curiae (partes interessadas) no processo a Aneel e o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec). "Não é correto fazer o repasse dos tributos ao consumidor de forma individualizada", diz Maria Elisa Novais, gerente jurídica do Idec. De acordo com ela, como o PIS e a Cofins incidem sobre o faturamento da empresa, os tributos são parte do custo da empresa e já compõe a tarifa do serviço de energia, não podendo, portanto, incidir novamente sobre a tarifa.

"O repasse faz com que o consumidor seja onerado duplamente", diz Maria Elisa. Para ela, não há diferença entre a disputa no setor de telefonia e de energia, pois trata-se de contratos de concessão do serviço público baseados nos mesmos fundamentos. O Idec ainda não ingressou com uma ação coletiva em nome dos consumidores, mas, segundo Maria Elisa, ações individuais têm tido sucesso nos Tribunais de Justiça. Procurada pelo Valor, a Aneel não se manifestou sobre o tema.

Luiza de Carvalho, de Brasília