terça-feira, 4 de setembro de 2007

Trânsito: Crimes Impunes


JORNAL DA TARDE - CIDADE
Trânsito: crimes impunes
Ninguém vai preso em São Paulo por cometer crimes de trânsito. Especialistas ouvidos pelo JT afirmam desconhecer casos de motoristas que mataram ao volante e, condenados, cumpriram a pena atrás das grades. 'Acompanho essa área há 33 anos e não conheço nenhum caso que tenha dado cadeia', afirma o advogado Ciro Vidal, que foi diretor do Departamento Estadual de Trânsito (Detran) durante 11 anos e é um dos autores do Código Brasileiro de Trânsito. No ano passado, 1.487 pessoas morreram vítimas de acidentes de trânsito na Capital, segundo estudo divulgado há dois meses pela Companhia de Engenharia de Tráfego (CET). Desse número, 734 eram pedestres. 'As pessoas respondem em liberdade e, no máximo, são obrigadas a prestar serviços à comunidade ou pagar cestas básicas. Infelizmente hoje é isso o que vale uma vida perdida no trânsito', afirma Vidal. O Tribunal de Justiça não dispõe de estatísticas sobre condenações por crimes de trânsito. Até julho deste ano, 84 pessoas foram processadas por dirigir sem habilitação e 121 julgadas por terem praticado homicídio culposo na direção. O número de motoristas que responderam por lesão corporal culposa ao volante é bem maior: 525. O professor Damásio de Jesus, doutor em Direito e autor de mais de 20 livros, entre eles Delitos de Trânsito, acha que as mortes no trânsito deviam ser consideradas intencionais. Crimes de trânsito em que não ocorre morte, como excesso de velocidade, racha, lesões corporais culposas, direção sem habilitação ou fuga do local do acidente vão parar no Juizado Especial Criminal da Capital (Jecrim) onde são analisados crimes de menor potencial ofensivo e cuja pena máxima não supera dois anos em regime aberto. Se o motorista for condenado a pena de detenção e não for reincidente, na prática ele cumpre a pena em casa, em prisão domiciliar. Se primário, sequer fica com a ficha suja. Estima-se que, dos quase 10 mil processos em andamento atualmente no Jecrim, cerca de 10% se refiram a crimes de trânsito. 'As infrações de trânsito são entendidas como imprudência, mas o que tem acontecido é muito mais do que imprudência, imperícia ou negligência', acredita o promotor Nilberto Bulgueroni, de 45 anos, coordenador do Jecrim. Ciro Vidal também defende revisões no Código Brasileiro de Trânsito. Ele diz que quem dirige bêbado sabe o risco que provoca. 'Essa é a nossa briga. Queremos mudar o tratamento penal. Que casos assim sejam enquadrados em homicídios dolosos e não culposos', defende o psicólogo Salomão Rabinovich, diretor do Centro de Psicologia Aplicada ao Trânsito (Cepat) e presidente da Associação das Vítimas de Trânsito (Avitran). Medidas imediatas O professor de Direito Penal da Universidade de São Paulo (USP) e diretor do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (Ibccrim), Sérgio Salomão Schecaira, defende medidas administrativas de controle que coíbam irresponsabilidades no trânsito - a penas restritivas de liberdade. 'Mandar o motorista para a prisão não resolve, a não ser em um ou outro caso de reincidência', acredita. Para ele, medidas como a apreensão da carteira no caso de alguém ser flagrado dirigindo embriagado são mais práticas. Schecaira lembra que qualquer motorista pode provocar morte no trânsito por desatenção ao volante. 'E, necessariamente, não precisa estar em alta velocidade ou embriagado', afirma. 'Impedir que essa pessoa dirija pode ser mais eficaz do que prendê-la.' Luísa Alcalde e Gabriela Gasparin

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